segunda-feira, 14 de junho de 2010

Crítica: Vida de Inseto

O menos "pixariano" da Pixar


Imagine-se uma formiga. Agora imagine que seu formigueiro está sob o domínio de um grupo de gafanhotos psicopatas que exigem que vocês, formigas, juntem uma quantidade de comida para eles, caso contrário… bem, você sabe. Agora adicione duas características à sua personalidade: você é engenhoso, adora fazer invenções, mas é desastrado. Muito. Pronto, você já está no lugar de Flik (Dave Foley), protagonista de Vida de Inseto, segundo longa da Pixar. Só contando um pouco mais a história, pra que você possa entender: Flik inventou uma máquina pra acelerar a colheita de comida, mas por conta do seu histórico de invenções falhas, ninguém dá bola ou sequer aceita usar essa invenção. E não dá outra: a desastrada formiguinha acaba estragando tudo que foi colhido para os gafanhotos e o prazo para a entrega aos gafanhotos já está no fim, o que faz com que todos queiram expulsar o pobre Flik do formigueiro, mas ele se candidata pra ir além da Ilha Formiga buscar guerreiros para combater os malvados gafanhotos. Já prevendo um insucesso dele, a Princesa Atta (Julia Louis-Dreyfus) permite que ele vá.

A premissa é bacana e inteligente. Porém, com exceção ao protagonista Flik, nenhum outro personagem parece lá muito interessante. Pelo contrário. A pequena Dot (Hayden Panettiere), por exemplo, é sem-graça e extremamente insuportável. A Princesa Atta também é desinteressante. Hopper (Kevin Spacey), o líder dos gafanhotos, é caricato ao extremo, mas até funciona, já que sua figura está ali para mostrar um ditador cruel. Ao contrário de Molt (Ricahrd Kind), irmão de Hopper, que divide com Dot a posição de pior personagem do filme. O “exército de guerreiros”, que Flik arranja, também não gera um maior interesse, mas cumpre o simplório papel de apenas fazer rir.



Mas o filme tem um trunfo que dura pouco tempo em tela, mas já é suficiente pra encher nossos olhos e se fixar em nossa memória por um bom tempo: a cidade dos insetos, onde Flik arruma os seus guerreiros. Linda, toda feita com caixas de alimentos, movimentada e que faz uma reprodução perfeita das nossas grandes cidades e que ainda conta com homenagens a outros filmes da casa, como Toy Story e Rei Leão (esse último, só da Disney). Outro trunfo são duas passagens inspiradíssimas: a que a joaninha Francis (Denis Leary), macho, se irrita ao receber cantadas de dois insetos e desfere: “Por que todos acham que toda joaninha tem que ser fêmea?”; e uma frase dita por uma mosca: “Só tenho 24h de vida, não vou desperdiçá-la aqui!”. Isto é, duas passagens dignas do selo Pixar.

Falando no estúdio, é até cruel a comparação com os outros filmes dele, já que quando Vida de Inseto foi lançado, a Pixar tinha feito apenas um longa: Toy Story. Ou seja, o escorregão é compreensível e perdoável. E outra: nem é um escorregão tão feio assim. Mas uma comparação inevitável é com o longa, também de animação, FormiguinhaZ, que além de ter sido lançado no mesmo ano, o longa da DreamWorks também se passa num formigueiro. E aí a crueldade é enorme e, nesse caso, justificável. O filme, que tem Woody Allen como a formiguinha Z do título, ganha de Vida de Inseto em praticamente todos os quesitos: personagens, história, consequências dos atos etc.

O fator em que Vida de Inseto tem como vantagem sobre FormiguinhaZ é a trilha sonora, que foi, inclusive, indicada ao Oscar, perdendo para o grande vencedor da cerimônia de 1999, Shakespeare Apaixonado. É bom lembrar que nessa época ainda não havia a categoria Melhor Longa de Animação.



E talvez o maior ponto fraco do filme seja só fazer rir, não criando personagens mais interessantes, desperdiçando ótimas oportunidades de criar laços mais fortes entre eles e, também com isso, levantar mais questões sociais e imergir nelas sem medo (o que FormguinhaZ fez com tremendo sucesso), e não apenas mostrar superficialmente alguns pontos que poderiam ser mais importantes no filme, como a luta contra a repressão e a importância de pensar com a própria cabeça, e não apenas seguir o que já é pré-estabelecido sem ao menos ponderar se isso está bom, se é certo ou se pode melhorar. Lição essa que a Pixar mostrou ter aprendido muito bem, como demonstrou com louvor nos seus longas seguintes.

Vida de Inseto funciona como divertimento rápido, esquecível, com poucas piadas inspiradas, mas nenhuma fora de contexto, o que faz o filme inteiro rodar bem sem ser cansativo ou maçante. O diretor John Lasseter (que já havia demonstrado imenso talento com Toy Story) conduz bem o roteiro, não permitindo que o filme soe episódico. Mas é fato que, ao fim do filme, o sentimento é de que ele poderia ter sido bem melhor.





Nome original: A Bug’s Life
Ano: 1998
Duração: 96 minutos
Direção: John Lasseter e Andrew Stanton
Roteiro: Andrew Stanton e John Lasseter
Elenco: Dave Foley, Kevin Spacey, Hayden Panettiere, Julia Louis-Dreyfus, Denis Leary e Richard Kind

Imagens: divulgação

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